
O mundo da gastronomia é cheio de modismos e regras não escritas. O que era um must e muito chique hoje, pode ser banido com se fosse a peste amanhã. Exemplos não faltam: quem não se lembra de como era chique um coquetel de camarão, aquela fileira de camarões servidos com molho rosado.
Não deixou de ser gostoso, só deixou de ser fashion! Filé de boi ao molho madeira (quando bem feito), pelo menos para mim, continua uma delícia – mas se tornou um pecado gastronômico sem direito a perdão. Hoje só se come cordeiro, e se você não gostar estará relegado ao ostracismo social. Pior ainda é se você ousar não gostar de risotos! Meu Deus que heresia. Enfim, o que quero dizer é que regras e modas na gastronomia sempre existiram e não deixam de ditar o que comemos, queiramos ou não.
Existem alguns ingredientes que se tornaram verdadeiras estrelas neste mundo gastronômico globalizado. Chegaram, tomaram nossos pratos de assalto e se apossaram das nossas dispensas impiedosamente. É importante conhecermos um pouco sobre eles, não só para sabermos usá-los corretamente, mas também para dar a eles o valor que eles merecem.
Um desses ingredientes é o vinagre balsâmico. Esta delícia tem história, tradição e merece o respeito e a reverencia de toda a comunidade gastronômica.
O vinagre é um produto que há centenas de anos faz parte da alimentação humana e as primeiras referências a sua existência em relatos datam de 8.000 a.C. Hoje pouco se fala das suas propriedades terapêuticas, mas o vinagre era muito utilizado para tratar problemas respiratórios, feridas, úlceras, e também como antiinflamatório e desinfetante.
O azedar é um processo natural que ocorre quando um líquido contendo menos de 18% de álcool é exposto ao ar. A bactéria presente no ar reage com o álcool para formar uma camada fina de fungo que é chamada de “mãe”. Esta “mãe” é uma camada de células de fermento e bactéria que transforma o álcool em ácido acético, o que dá ao vinagre o seu sabor distinto. Teoricamente pode-se fazer vinagre de qualquer líquido contendo álcool – vinho, sidra, cerveja, sucos de fruta fermentados, malte, arroz, pinga e até água de coco fermentada pode produzir vinagre. No Brasil o consumo de vinagre é pequeno, uma média de 0,6 litros por pessoa por ano.
Já na Europa, o consumo chega a 4 litros por ano, isto porque o vinagre, além do uso culinário, é também muito utilizado na higiene da casa para limpar carpetes e tapetes, como desinfetante, na lavagem de roupas e como neutralizador de odores como fumaça e cigarro. Legalmente o termo vinagre só pode ser utilizado para um produto que teve dupla fermentação: a primeira para produzir álcool e a segunda para a adição da bactéria que vai transformar o álcool em ácido acético. A legislação brasileira também dita que a concentração de ácido acético deve ser superior a 4,0%.
O que faz o vinagre balsâmico ser tão especial, tão diferente dos outros vinagres? O vinagre balsâmico é um vinagre italiano, conhecido há mais mil anos, produzido na região do norte da Itália chamada Modena. A região produz um vinho com baixo teor alcoólico, que é pouco recomendado para exportação mais muito bom para a produção de vinagre.
A uva usada é a branca Trebbiano. O mosto (suco obtido da prensa das uvas no início da fermentação alcoólica) é fervido até que o seu teor de açúcar seja elevado, uma redução de 20 a 30% do volume inicial. Daí vem o adocicado do vinagre balsâmico. Este liquido é então colocado em barris de madeira para se tornar um vinagre balsâmico. É ai que entra então toda a arte na sua fabricação. O processo é artesanal e a produção fica na média de dois mil litros por ano.
O envelhecimento é feito em diferentes etapas em diferentes recipientes de madeira: a castanheira dá a cor escura; o recipiente em amoreira acelera o processo de envelhecimento; a cerejeira dá ao vinagre um toque de açucarado e finalmente os recipientes em cedro ajudam a impedir a evaporação do vinagre na reta final de envelhecimento. Tudo isto leva no mínimo 20 anos podendo se encontrar vinagre balsâmico com até 50 anos de idade. O resultado final é um liquido denso, escuro, com gosto e aroma inigualáveis.
Os suíços são os maiores consumidores de vinagre balsâmico, seguidos pelos norte americanos. É preciso saber que somente o vinagre que tenha escrito no seu rótulo “vinagre balsâmico tradicional de Modena”, ou “denominação de origem”, ou também “consortium”, pode ser considerado autêntico. Outra grande diferença é o preço e é claro que ele não se compara ao líquido ácido, escuro e completamente sem interesse encontrado nos balcões de churrascarias e restaurantes do Brasil.
O verdadeiro balsâmico deve ser usado com parcimônia, algumas gotas misturadas ao seu molho de salada são o suficiente para dar um toque especial no sabor. Pode ser usado também com frutas, combina particularmente bem com morangos picados, e com quase todos os tipos de carne. Para suprir a demanda do vinagre balsâmico criou-se um produto feito de vinagre de vinho e caramelo que é, infelizmente, o que muita gente acredita ser balsâmico – mas não é.
Uma garrafinha de verdadeiro balsâmico na dispensa de qualquer chef ou gourmet vale mais que um curinga em jogo de baralho. Algumas gotas realçam o sabor de qualquer prato, doce ou salgado. Uma última dica, quanto mais velho o vinagre mais forte vai ser seu sabor e menos deve ser usado.
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